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Bonanza (1959)
75%
Avaliação dos usuários
Sinopse
Filipe Manuel Neto
Escrita em 8 de Julho de 2022**Hoje, finalmente, entendi este filme… e fiquei maravilhado com ele.** Penso que aquilo que aconteceu comigo foi exactamente o mesmo que aconteceu com a maior parte das pessoas: quando vi este filme a primeira vez, há anos, não entendi nada. Isso manteve-se por muito tempo: sempre que eu via este filme acabava por não o entender. Isso acabou hoje, quando o vi com um amigo meu, que também gosta de cinema e que me disse _“tens de ter duas coisas em conta: a primeira é a narrativa não-linear, por vezes com mudanças muito subtis; a segunda é que a maior parte do filme não é a vida real, é um sonho da protagonista”_. Se há filmes quase perfeitos, este está perto disso, embora não seja fácil entendê-lo e seja necessário vê-lo cinco ou seis vezes para o compreendermos bem. Eu já tinha tido a experiência de que os filmes de David Lynch não são fáceis… tive o primeiro contacto com o director há uns anos, com o filme _Veludo Azul_, e percebi que ele faz filmes herméticos, com ideias implícitas, sugestões sub-reptícias e oníricas, que muitas vezes (quase sempre) fogem ao olhar do público. Gosto disso: é um tipo de cinema desafiador, que faz pensar e mexe connosco. Não significa que eu perceba tudo ou me aperceba de tudo! E hoje, à conversa com o meu amigo, consegui por fim entender melhor este filme. Feito inicialmente em 1999, como um episódio-piloto para uma série de TV, foi transformado em longa-metragem após os produtores televisivos rejeitarem o produto. A própria forma como Lynch deu a volta ao seu fracasso e o transformou num dos seus maiores sucessos é marcante, reveladora do seu estilo e persistência. O filme é realmente bom e creio que, ao comentar o que aprendi hoje, já estou a ajudar quem o quiser ver e entender. Se ficarmos atentos, ele indica-nos os momentos em que a personagem principal adormece (logo no início) e acorda novamente. E eu creio que posso ainda dizer, sem estar a revelar demasiado, que a festa em casa do director de cinema, já bem perto do final do filme, é a cena-chave para entender mais de metade da trama, que se centra, basicamente, numa jovem que vai para Los Angeles com o sonho de se tornar rica e famosa e fracassa nesse intento, aliando a essa frustração um enorme desgosto de amor e a perda dos seus próprios valores morais e inocência. O elenco está perfeitamente à altura dos desafios que vai recebendo do director, e é incrível ver Naomi Watts aqui. Este filme simboliza verdadeiramente o arrancar da carreira dela enquanto actriz, na medida em que apenas fez alguns trabalhos menores, na Europa e nos EUA, até fazer este filme. Ela é verdadeiramente excelente, conseguindo captar toda a nossa simpatia e fazer-nos gostar da personagem dela. Até certo ponto, acho que a actriz se reviu muito na personagem que fez: também ela tinha o sonho de singrar na carreira cinematográfica e também ela sofreu para o conseguir finalmente. Também Laura Harring esteve muito bem e merece um louvor pelo seu trabalho. Justin Theroux, que interpretou o director Adam Kesher, dá um contributo bem-vindo e sólido ao trabalho das actrizes, ainda que este filme seja claramente dominado por elas. Tecnicamente, o filme é uma aula de cinema a todos os níveis. Além da brilhante direcção, Lynch aposta bastante na cinematografia. Aqui, vale a pena ver como ele usa os cenários que escolhe, as paisagens da cidade, e algumas técnicas como o zoom, o close-up, o desfoque, para passar ao público mensagens acerca do estado de espírito das personagens. Também aproveita bem a cor, vibrante e bonita, sendo que as cores vermelho e azul têm um significado particularmente importante para a compreensão do filme, e do que está a ser visto. O filme tem algumas cenas de nudez e de sexo bastante intensas, e um ritmo bastante lento que é intencional. Os cenários também são muito importantes: por vezes, a disposição dos objectos e a forma como os actores se relacionam com eles ajuda-nos a entender o que vemos, mas isso é verdadeiramente subtil e é preciso estar atento. Finalmente, uma palavra muito especial para a banda sonora, hipnótica e quase inesquecível, assinada por Angelo Badalamenti, e que vale a pena ouvir com atenção, desde o ‘leitmotiv’ principal às canções, alegres e despreocupadas, ao estilo dos anos 50.