Em Busca da Terra do Nunca (2004)
Aonde sua imaginação o levará?
Sinopse
Filipe Manuel Neto
Escrita em 15 de Outubro de 2021**Um bom filme biográfico, que infelizmente não é absolutamente fiel à vida do biografado.** Este filme não é exactamente um filme sobre Peter Pan, mas sobre o seu criador, o dramaturgo inglês J.M. Barrie. Ao contrário do que o filme parece indicar, era um dramaturgo conceituado e tinha prestígio quando escreveu a peça que o imortalizou definitivamente. De facto, o filme é um pouco inexacto na maneira como conta os acontecimentos da vida do dramaturgo, o que é sempre uma pena para mim, que aprecio quando um filme biográfico é fiel à vida daquele que é biografado. O filme é bom, é realmente muito bom. Apenas é necessário compreender isto: é um filme, portanto é parcialmente ficção. Neste filme, Barrie é um homem infeliz no casamento e profundamente insatisfeito com as suas próprias peças teatrais, alguém que sente que é capaz de fazer melhor e exige isso de si mesmo. Decide, assim, utilizar a sua convivência com um grupo de crianças, filhos de uma viúva da alta sociedade londrina, para se inspirar na criação de uma nova história. Mas a relação pouco usual entre ele e a família Davies vai contar com a oposição da própria esposa, da avó das crianças e, também, dos olhares sarcásticos da sociedade vitoriana. O filme aproveita muito bem a relação entre Barrie e as crianças… uma relação que hoje em dia iria, seguramente, fazer muitas pessoas franzirem o sobrolho. De facto, vivemos hoje debaixo de uma sociedade que eu penso ser mais desconfiada e que tem dificuldade em acreditar que alguém tem, realmente, boas intenções nas suas atitudes. A história é boa, o roteiro, apesar de não ser fiel à vida de Barrie, está bem feito e bem escrito, e a direcção de Marc Forster provou ser muito boa. O elenco conta com vários nomes conhecidos, mas o papel principal é de Johnny Depp. Ele é um daqueles actores que nós já acostumamos associar a personagens estranhas, invulgares, fora da caixa. Neste caso, é o oposto. Ele encarna um cavalheiro vitoriano elegante, discreto, contido e com uma personalidade tranquila, muito embora com uma imaginação fértil. Ele mais uma vez dá mostras de versatilidade e habilidade como actor, e faz um trabalho muito feliz. Kate Winslet também já dispensa apresentações e tem créditos firmados. Neste filme, ela brinda-nos com um trabalho muito bom, onde consegue ombrear com os colegas numa personagem que me parece psicologicamente exigente. Julie Christie dá vida à matriarca da família Davies de uma maneira elegante, muito de acordo com o período histórico e de uma maneira convincente. Apesar de surgir muito menos em tela e de ter uma personagem desagradável, Radha Mitchell levou a bom porto a sua tarefa e desembaraçou-se bem. Tecnicamente, o filme conta com uma excelente cinematografia, que consegue realmente ser ainda mais interessante quando nos mostra, em breves relances, o mundo mágico que começa a surgir na mente do dramaturgo. A construção dos cenários e a escolha dos adereços ajudou à criação de um ambiente de época convincente e realista, e a selecção de alguns cenários ainda acrescentou elegância visual ao filme, especialmente nas cenas do teatro e do parque. Ainda uma palavra de louvor para a idealização dos figurinos e para a banda sonora.