Dr. Fantástico
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Dr. Fantástico (1964)

29/01/1964 Comédia, Guerra 1h 35min

81%

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ou Como Aprendi a Parar de Me Preocupar e Começar a Amar a Bomba

Sinopse

Um general americano meio louco, Jack D. Ripper, acredita que os soviéticos estão sabotando os reservatórios de água dos Estados Unidos e resolve fazer um ataque anticomunista, bombardeando a União Soviética para se livrar dos "vermelhos". Com as comunicações interrompidas, ele é o único que possui os códigos para parar os bombardeiros e evitar o que provavelmente seria o início da Terceira Guerra Mundial.

Críticas
Filipe Manuel Neto

Filipe Manuel Neto

Escrita em 19 de Dezembro de 2022

**Sexo e guerra num filme extremamente sarcástico e inteligente.** Este filme é um dos melhores da carreira do director Stanley Kubrick, e é também uma das mais icónicas e ácidas sátiras que o cinema já viu. Inspirado num romance tenso que foi publicado no mesmo período, e nos acontecimentos políticos e militares que se viviam então, o filme dispara em todas as direcções para nos dar a imagem mais absurda e ridícula da rivalidade entre os EUA e a União Soviética. Apesar de tudo, e de todos os pontos a favor, eu não acho que este filme seja uma comédia de facto. A mim, sinceramente, não me fez rir, embora eu absorva e compreenda a ironia ácida que está aqui. O roteiro começa com um gravíssimo incidente que poderia ser verdadeiro (e os EUA chegaram mesmo a rever as suas estratégias militares de forma a impedir que algo parecido acontecesse na vida real): após inventar, na sua mente perturbada, uma teoria conspirativa louca segundo a qual os soviéticos estariam a envenenar a água potável americana, um tresloucado general dá início a um protocolo militar previamente orquestrado, e destinado a retaliar um ataque russo com toda a força do arsenal nuclear disponível. Só que com um detalhe: não houve um ataque russo, o que tornaria os americanos no país agressor, e nos responsáveis por um holocausto de proporções bíblicas. Informado disso, o presidente reúne-se com os seus generais e, em directa articulação com o Kremlin, procura por todos os meios impedir o pior. O que este filme tem de extraordinário é a forma como ele ridiculariza o tesão sexual que várias personagens têm em torno da guerra nuclear. Para essas personagens, o fim do mundo, a guerra total, é um absoluto fétiche, retractado com detalhes quase eróticos. Os casos mais evidentes são os generais Ripper e Turgidson: cada um a seu modo, expressão de modo veemente a ligação mental que fazem entre sexo e guerra. Seja pela forma como falam e se expressam, ou de modo mais implícito, ao segurarem elementos fálicos cada vez mais evidentes, eles são homens que têm tesão na guerra. Na mesma linha de pensamento, o comandante da aeronave americana, que se transforma num vaqueiro a cavalo na bomba nuclear, como se esta fosse o prolongamento do seu falo masculino. E o que dizer da personagem de Strangelove? O nome dele diz tudo! Ele é um cientista nazi a serviço dos americanos, e a forma como ele procura conter a excitação na expectativa do fim do mundo é evidente, por exemplo, na ideia que sugere de um abrigo subterrâneo onde os sobreviventes, escolhidos a dedo (a ideia nazi da eugenia está bem presente aqui), passariam o tempo a fazer sexo para salvar humanidade. Este é um dos filmes grandes da carreira de Peter Sellers, actor britânico que se consagrou com a comédia. Eu já vi vários filmes dele, e já conheço a habilidade dele para interpretar mais de uma personagem no mesmo filme. Aqui, ele dá vida a três das personagens principais, sempre com a mesma qualidade e profissionalismo. Ele é tão bom que foi realmente difícil reconhecer o actor. George C. Scott e Sterling Hayden também estão de parabéns pelo trabalho que fizeram neste filme, que foi seguramente um dos que mais os imortalizou enquanto actores. O melhor aspecto técnico do filme é a cinematografia. Kubrick usou várias técnicas para veicular a sua mensagem erótico-militar, como os créditos de abertura, onde um reabastecimento em voo se torna numa cópula simbólica. Os enquadramentos da câmara também foram pensados em detalhe, com cenas em close-up estrategicamente colocadas, algumas personagens muito bem destacadas e outras reduzidas à mínima expressão de si mesmas (o presidente americano, o qual é retractado como um incompetente, que nem o seu exército consegue controlar). O filme é uma verdadeira lição de cinematografia a preto-e-branco. Os cenários e os figurinos também são excelentes, e o ataque à base aérea é uma das melhores e mais realistas cenas de combate que eu já vi num filme de guerra moderna. A banda sonora, por fim, é das mais irónicas que há, e combina perfeitamente com a tónica do filme. Destaque, claro, para os temas de abertura e do final.