Despedida em Las Vegas (1995)
Sinopse
Filipe Manuel Neto
Escrita em 20 de Maio de 2023**Um filme denso, difícil de ver, mas que deveria ser visto especialmente pelos jovens que acham que ficar bêbado é relevante para uma noite de diversão.** Este filme é feito em cima do relato verdadeiro de um homem que perdeu a vontade de viver, após um divórcio complicado e o fim da sua vida pessoal e profissional à medida que ia dando espaço para o vício do álcool. Sem perspectivas de conseguir dar a volta por cima, ele resolve ir para Las Vegas, a cidade de todos os pecados nos EUA, e beber tudo o que puder até pôr fim à sua própria vida. Nos entrementes destes intuitos suicidários, ele conhece uma prostituta com quem tem um relacionamento muito complicado porque, no fundo, também ela percorre o seu próprio caminho de autodestruição. O filme é excelente, mas é profundamente pesado, depressivo, difícil de ver. Além de nos levar ao lado mais negativo e destrutivo do alcoolismo, também nos mostra, sem medo de chocar, a forma como isso pode levar à morte. Isto é, mostra-nos em cores muito duras que a bebida é um vício, é um problema sério e pode matar. Torna evidente que o álcool não é uma coisa que possamos ou devamos relativizar, um excesso pontual, ocasional, de sexta-feira à noite. Não é uma coisa que devamos tolerar no comportamento dos nossos filhos ou familiares. Eu digo isto numa altura em que a bebida se tornou algo demasiado vulgar, principalmente entre os jovens, para quem ficar bêbado é uma condição “sine qua non” para uma noite de diversão. Quem for trabalhar na manhã seguinte pode ver facilmente jovens, muitos deles mulheres e com aspecto de não terem sequer 20 anos, sentados na berma da calçada, junto a discotecas ou paragens de autocarro, perdidos de bêbados ou a vomitar em cenas dignas de uma pena que me recuso a sentir porque, afinal, eles desejaram ficar assim. Muitos são portugueses, mas também há muitos turistas que parecem vir para o meu país porque a lei é mais permissiva do que deveria. Para mim, que fui educado para o perigo dos vícios e só fiquei seriamente bêbado uma vez, custa-me ver como esta juventude considera o excesso fundamental na diversão e só espero, um dia que seja pai, nunca ter de ir buscar um filho em tal estado. Eu teria vergonha. Este é um dos filmes que fez a carreira de Nicholas Cage. O actor faz um trabalho notável, e se nós pensarmos na reviravolta que a vida e carreira dele viriam a dar posteriormente, é mesmo uma pena que ele não tenha conseguido manter este nível. É difícil ver a forma como ele dá à sua personagem todos os elementos para captar a nossa simpatia à medida que ela desliza por um caminho sem retorno. Elizabeth Shue, que deu vida à prostituta, também faz um trabalho cheio de méritos, ainda que a personagem dela seja bastante mais convencional. Afinal, não é a primeira vez, nem foi a última, que o cinema conheceu uma prostituta com sentimentos. Há uma história de amor entre as duas personagens, isso é inegável, mas podemos questionar até que ponto ela é realmente crível, posto que nunca o amor é usado para redimir ou conceder às personagens um caminho de salvação, uma saída da vida de vício e destruição em que estão. E até certo ponto, mesmo que isso seja ensaiado, tal opção é largamente rejeitada, em especial pela personagem de Cage, que parece decidida a morrer. Tecnicamente, o filme tem vários pontos de mérito, especialmente no tocante à cinematografia e à edição. O filme foi muito bem filmado, usa muito bem a luz e a sombra para adensar todo o ambiente de degradação em que as personagens se movimentam, com as luzes brilhantes dos casinos a funcionarem, quase, como a chama brilhante que atrai as mariposas para a morte e a perdição. É nesse ambiente que vemos as personagens viverem as únicas cenas de prazer e de descontracção, as quais só servem para as continuar a empurrar para o fundo do poço. Muito bem editado, o filme não perde tempo com coisas que não interessam, mantém um ritmo bem agradável e proporciona duas horas que nos deixam a pensar.