Até o Fim do Mundo (1991)
O Melhor Filme de Estrada.
Sinopse
Filipe Manuel Neto
Escrita em 15 de Março de 2024**Uma obra faraónica que correu terrivelmente mal.** Já vos aconteceu tentarem fazer algo extremamente complicado e ambicioso e falharem por culpa da enormidade do que estavam a tentar fazer? Eu aposto que mesmo aqueles a quem isso nunca aconteceu vão saber nomear alguns exemplos: obras públicas faraónicas que correram mal ou nunca se concretizaram na totalidade, projectos e empresas privadas que fracassaram por culpa dos seus próprios erros, enfim. Exemplos não faltarão e acho que podemos juntar este filme a essa lista, posto que a principal falha deriva das ambições do seu criador. Wim Wenders é um dos grandes directores alemães do nosso tempo e ninguém lhe pode negar esse mérito, nem mesmo aqueles que não apreciam muito o seu estilo, ou que o criticam (com alguma propriedade) por se ter transformado, em anos recentes, naquele tipo de director que o próprio criticava nos começos da sua carreira. Porém, o que ele quis fazer neste filme era uma tarefa muito superior às suas capacidades e engenho. Um épico de mais de vinte horas de duração que foi condensado num resumo de três horas e meia e, anos depois, parcialmente restaurado na forma da “versão do director”, com quase seis horas. Eu cometi o erro de tentar ver, precisamente, esta última, crendo que estaria a ver a versão mais próxima à visão do criador. Todavia, o que ele nos dá é tão desinteressante e tão confuso que dei o meu tempo por mal empregue. A história começa com a ameaça de um satélite nuclear indiano, que se vai despenhar na terra, e depois introduz Claire, uma jovem que parece procurar um rumo na sua vida em meio a uma existência fútil. Após um acidente de carro em que conhece dois assaltantes de bancos, ela aceita levar o dinheiro roubado até Paris, a troco de uma percentagem. Em meio a isto, presta ajuda a um homem misterioso que parece estar a fugir de um assassino e que lhe rouba parte do dinheiro. Apostada em recuperá-lo, ela segue-o pelo mundo e acaba por contractar um detective privado. Como creio que já deu para entender através deste resumo, a trama não é desprovida de boas ideias e tinha potencial. Com as personagens sempre em andamento, a viajar pelo mundo, o filme não é monótono e tem certo potencial para a comédia leve (se bem que o humor de Wenders é totalmente alemão e nós sabemos o que isso significa). Porém, o filme perde-se em reviravoltas constantes que não vão dar a lugar nenhum. Circulando de um país para outro, a trama desperdiça horas da nossa vida numa história sem substância ou conteúdo. Wenders não nos poupa e dá-nos longas cenas onde as personagens dirigem automóveis, caminham ou fazem chamadas telefónicas. Ele parece uma criança de cinco anos que começa a contar aos pais a história mais mirabolante só para pedir um brinquedo que viu numa loja. Isso é aquilo que deita o filme a perder e o torna insuportável. Ah, e é claro que a questão do satélite em queda acaba totalmente esquecida no meio disto tudo. Os valores de produção são bastante bons, considerando que é um filme europeu e que os milhões da máquina de Hollywood estão ausentes da equação. Wenders conseguiu criar alguns elementos algo futuristas como telefones públicos com videochamada ou motos de polícia com aspecto arrojado e bizarro. Os cenários urbanos parecem hostis, com toda a sorte de lixo e grafitos. A cinematografia é magnifica, e o director aproveita-a tanto quanto possível, como é habitual nos filmes que faz, mas em compensação a banda sonora é virtualmente inaudível e não acrescenta qualquer qualidade ao trabalho final. Solveig Dammartin foi uma boa escolha para a personagem principal. Ela é elegante e dá um charme especial à sua personagem durante todo o filme. Infelizmente, ela não pode fazer milagres com o material que lhe foi dado e o seu desempenho é vítima disso. Sam Neill também aproveita a ocasião da melhor forma que pode, mas o filme está longe de ser um dos melhores da sua carreira, e o mesmo se poderá dizer de William Hurt. Ambos se empenham, e o trabalho deste trio de actores acaba, assim, por ser o valor mais redentor que o filme tem para nos apresentar. Infelizmente, estão presos ao material recebido, que mata totalmente os seus esforços.