Belas Artes à La Carte
A Malvada (1950)
É Tudo Sobre Mulheres... E Seus Homens
Sinopse
Joseph L. Mankiewicz
DiretorDarryl F. Zanuck
ProdutorFilipe Manuel Neto
Escrita em 15 de Outubro de 2022**Apertem os cintos: este é um dos melhores filmes do século XX.** Não há muitos filmes perfeitos: eu, pelo menos, não conheço muitos. Todavia, este filme é quase seguramente um deles. Fruto de uma conjugação ideal de factores, que harmoniosamente se uniram para o tornar numa obra de arte, é um filme atemporal que se vê tão prazenteiramente hoje como há cinquenta anos. Mas, quando falamos em filmes clássicos, está bem longe de ser um dos primeiros a vir ao pensamento. Qual a razão? É difícil de explicar, mas sinto que o filme nunca tocou realmente o coração do grande público. O filme merece mais atenção hoje em dia e vale a pena vê-lo. Não sou um daqueles que mede a qualidade de um filme pelos prémios que recebe (ainda que os prémios sejam, sempre, um indicativo a considerar quanto à qualidade)… mas o filme é um dos mais nomeados para o Óscar, com catorze nomeações, feito que só muito raras vezes foi igualado, e seis estatuetas conquistadas, incluindo a de Melhor Filme. O filme começa por nos mostrar uma cerimónia em que uma actriz, Eve, recebe um importante prémio pelo seu desempenho no teatro. Depois, a acção recua um ano para, em flashback, nos dar a conhecer tudo o que sucedeu até àquele momento. E é assim que acompanhamos toda a ascensão de Eve, uma aspirante ao palco de origens obscuras que consegue suscitar a piedade e simpatia da actriz Margo Channing, então a maior estrela dos palcos. O filme explora bem as duas personagens, e a forma como se relacionam. Eve é bastante ambígua por parte do filme, e mesmo depois de vemos o lado mais sombrio da personagem. Margo parece uma megera muito insuportável, mas a personagem tem um bom coração, escondido sob toneladas de ego e tiques de grande diva do teatro. Baseado num conto e inteligentemente desenvolvido por Joseph Mankiewicz, director que vai assegurar o roteiro, o filme conta com um excelente elenco e diálogos memoráveis, cheios de frases citáveis que provavelmente já ouvimos algures por aí. O elenco é liderado poderosamente por Bette Davis, uma actriz extremamente talentosa, carismática e cheia de personalidade que deu tudo de si neste filme, conseguindo alcançar aqui, na minha perspectiva, o seu trabalho de glória. A diferença entre Margo, a personagem, e Davis, a pessoa real, é tão fina que quase que podemos dizer que a actriz pegou na personagem e trouxe-a um pouco para a sua própria vida. É um exercício dramático verdadeiramente soberbo, e o mesmo se aplica àquele que nos é dado pela sua co-protagonista, Anne Baxter, que dá vida a Eve. A forma como ambas colaboram nas suas cenas é hipnotizante. Também gostei bastante de Celeste Holm, George Sanders e Hugh Marlowe, muito embora os homens deste elenco não estejam tão fortes quanto as contrapartes do sexo feminino. Sendo um filme a preto e branco, isso pode desagradar um pouco ao público actual, mas não é algo que eu encare como um problema. Pelo contrário, gostei muito da cinematografia e penso que o filme tem muita elegância e beleza visual. Há algumas cenas e movimentos de câmara que eu estranhei, mas penso que alguns são realmente pouco usuais em filmes desta época. Quanto aos figurinos, gostei bastante da forma como se adequam à história, sendo que alguns figurinos e vestidos das actrizes são peças dignas da alta costura. O filme tem algum humor implícito, que pode escapar aos mais desatentos, como aquela peça de piano que Davis, embriagada, ouve por várias vezes para, mais tarde, a apelidar de “sentimentalismo barato”.